sábado, 15 de outubro de 2011

"RECAÍDA"




Mais um daqueles janeiros da fronteira oriental, 14 horas de sol batido no geral perto de 35 graus, a tarde, então, é longa. Um Ipanema volteava e tome carregar uréia.
Terminou a atividade, assolhada a equipe se acomodou, mateando, nas casas, pela graça divina o sol ia baixando e entrou uma brisa. É um momento em que se fala baixo, calmamente, esta hora solene é cumprida numa varanda, as cadeiras ajeitadas de modo que se possa olhar longe, para os campos e bichos que se movimentam no final da tarde. Comentavam-se coisas e fatos do dia, e já se pensava em deixar o local e ir para a cidade.

Mas aí, amigos, o destino principiou a fazer das suas. De repente dois bólidos urbanos vem numa nuvem de poeira saltando buracos e pedras e viram na porteira em direção da roda de chimarrão. Eram companheiros em missão, aí que reparamos, vinham carregados de petrechos variados, de comer, de pescar, de beber. Nos boleamos, cansados. Mas aí desceu bem uma loira gelada, vacilamos. Veio um trator com reboque e já carregou a tralha toda.
Foi-se a turma para uma beira de açúde, fogo alto, carne no fogo, cerveja, muita cerveja.

 Botei as linhas nágua, três só. Podemos garantir, aquele tempo da tarde morrendo e iniciando a noite é muito importante. Na verdade é uma troca de turno, aves diurnas se encaminham para os pousos e aparecem os atores da vida noturna.
Cansados os companheiros do trabalho arrumaram suas barracas e outros foram se arranjando de qualquer forma. Este velho combatente sabia que ia dar confusão, tentou atalhar a lida mas não deu, foi só cair a noite parou o vento e um voraz enxame de mosquitos tomou conta do lugar. Nesta altura a gente já tinha devorado pedaços gigantes de ovelha assada e pilhas de latas de cerveja. Verdade que tentamos dormir, em condições precárias, me acomodei embaixo do reboque, pelo menos evitava o sereno da noite, se alguém já passou noite no relento sabe o que é de ruim. Toda hora eu pensava em abrir os olhos e dar com uma cruzeira sibilante.

Madrugada grande se ouvia algo que se poderia definir como expressões de ódio que pipocavam esparsas pelo acampamento, desisti de dormir e voltei para as linhas. Não é que começaram a dar movimento, despacito juntei um pequeno monte. Vale dizer lá só tem traíra mesmo, elas tomam conta dos açúdes, fazem acordos com os cágados. Precisa dar um crédito para os urbanóides pescadores, ainda tinha cerveja gelada à vontade.

Podemos imaginar o amanhecer, companheiros mal humorados, nem precisa falar da aparência assustadora de cada um, iam se juntando aos que estavam na pesca. Revoltados avançaram na caixa de cervejas buscando energias extras.
Foi nesta hora que uma nervosa movimentação se originou perto do trator, demoramos a entender a ocorrência, era, digamos assim, um “arrumar”de tralha. Na verdade, depois vimos, voou tudo num amontoado de colchão, travesseiro e o que mais tivesse em direçao à carroceria do reboque.
Em seguida explodiu espécie de desabafo, “esta foi a última recaída”.

Abraço




2 comentários:

Gelsa Helena disse...

Incrível como pude visualizar a imagem dos arrependidos, em que aos poucos eles se dão conta de que entraram numa fria e o mau humor vai se instalando hahahahahaha
Que bom que você voltou aos seus textos bem humorados!

Gabriel Dalmazo disse...

Lembro de uma pescaria na Santa Heloísa, já organizada pela nossa geração. Piazada do tio Paulo, eu e namorados das meninas. Tio Paulo só ficou até o lusque-fusque, ao primeiro revoar dos malditos dípteros ele juntou o chimarrão e zarpou pra casa!