sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

CHURRASQUINHO DE GATO

Veio o final do ano, jornada legal, grande evento , convite para todos os companheiros.

Rendeu algum debate a melhor forma de encontrar o local, linda chácara em Piraquara mas não era, digamos, prudente, ficar se perdendo por ali. Experientes companheiros avaliaram os mapas disponíveis, alteraram as referências e deu certo, sem um caso sequer de extravio.

Algumas escaramuças foram registradas no estacionamento, avançar decidido em campos molhados é tarefa que exige certa prática, assim condutores muitos acostumados no trânsito urbano podem ter algum contratempo. Ao sair vimos um caso representativo, carro da colega ficou preso na lama, de pronto batizou os outros carros e pessoas ali perto. Prestativo um companheiro dizia, “se colocar o tapete dos pés na frente das rodas resolve?”..... não funciona, é claro, e mais lama para todo lado.

Enfim na festa cada grupo que chegava, rodava em círculos analisando a situação e depois se dispersava por ali. Passado este momento, iniciava um processo diferente de acomodação em algum grupo ou local. Nesta hora o que pesava eram as atrações do lugar, as âncoras, expressão que os shoppings usam para definir o que atrai, de verdade, os clientes.

Disparou largamente na preferência a banca do espetinho. Podemos lembrar, coisa de trinta anos, o espetinho ou churrasquinho de gato “iniciava sua caminhada”, era visto nas grandes aglomerações populares, o desfile de sete de setembro, na frente dos estádios e outros eventos, sempre com aquela marca, fumaceando e cheirando à carne sapecada. O apelido veio da falta de confiança que havia com a origem da carne, cortada em pedacinhos, bem temperada e sapecada em fogo alto, quem iria saber o que era, filé do supermercado é que não, se comentava, jamais se via um simples traço de carimbo do SIF. Mesmo assim, se ele estava lá, é porque tinha interessados, clientes, foi criando um mercado, um nicho. Infiltrou-se em outros eventos mais tradicionais as festas municipais, de igreja, de associações. Institucionalizado, foi preciso adequar às normas de outros produtos alimentícios. Agora temos a “indústria do espetinho de gato” é um prato nacional, firmas se especializaram para facilitar a situação. Ficou mais simples, os espetinhos vem prontos e embalados limpinhos, e os frigoríficos têm “uma linha” de produtos para esta paixão nacional, carne de frango, de gado, suínos e embutidos só para isto.

Intrigante para os analistas, mas tem uma série de vantagens competitivas. Nem todos são peritos assadores, tipo exportação, de Nova Bassano, qualquer um faz. Não precisa uma faca Coqueiro para cortar, não engraxa as mãos, não precisa prato, você pode sair com ele caminhando, pode ficar em pé nos “bolinhos” enquanto rola uma piada qualquer. E, principalmente é muito saboroso.

De início muitos esnobavam o “prato”, a história tem outros casos (como a feijoada), mas agora se entregam com prazer ao delicioso aperitivo, combina bem com cerveja gelada. Foi o que se viu na festa, ninguém sossegava até sair com um deles, qualquer sabor valia, partia dali para outras barracas. Os em início de carreira aceleravam até o ponto dos coquetéis, gostam de bebidas fortes, alguma coisa que contenha vodka. Os mais rodados, felizes se encaminhavam para mesas estratégicas, perto dos barris de chopp, já passaram para bebidas mais suaves.
Rematando, as crianças colavam na banca e, praticamente exigiam o seu, é para todas as idades. O prático assador de espetinhos, agora é profissão meritória, se esforçava, no limite dava um ponto num lado, virava e pronto lá ia um encantado apreciador do churrasquinho de gato.

Selso Vicente Dalmaso

terça-feira, 25 de novembro de 2008

MARATONA DE CURITIBA

Então, passou a lista de adesão à caminhada/maratona de Curitiba e nos inscrevemos em massa, depois nos informamos, mais de 70 companheiros do CSO, um “case” na comunidade local.

Em seguida formou-se alegre conversa, como vai ser, quem vai treinar e tudo mais. Foi um mês em “aproachs”, compra de leite em pó para a inscrição, distribuição de brindes, garrafas d’água e muita falação.

Sem mais avancei numa prateleira do Shopping e baixei tênis, dry feet, calção e meias, chegando em casa recebi um “era o que precisava mesmo”. Quando falei sobre a dieta especial das últimas duas semanas, fácil, fácil, arranjei outra encrenca, foi no momento que expliquei “lembra da noite do macarrão da maratona de Nova York”, uma expressão que lembro foi “até parece”, mas quando falei num elegante point da cidade melhorou a questão, era para nós dois claro, na última vez o talharim com frutos do mar mereceu duas garrafas de chianti. Chegou o dia, tomei vinho na macarronada; se cada soldado de Napoleão tinha direito a um litro de vinho por dia e ainda lutavam bravamente, eu também posso atacar um frisante.

Fiz uma escala progressiva de treinamento, iniciava com dieta leve: salmão grelhado, pão integral de centeio e óleo de oliva. Repetindo grill de frango e purê, postas de pintado, amêndoas, castanha do Pará, inclusão de caminhadas evoluindo até chegar aos 5 km dia. Fulminou com o combalido Valetik, vamos esperar o próximo mês.



Na sexta-feira chegaram as camisetas, parecia a escalação de uma equipe de competição, os atletas chegavam nas equipes e mostravam-se contentes, provocando um sorrisinho de inveja, aquela pontinha de ciúme, um ciúme bom, ouvia-se algo assim: fui deixar para depois, perdi a data. Na imagem podemos ver uma pilha dos cobiçados troféus, sofrendo análise rigorosa, era um modelo digno da fama da capital, tecido especial, muito bom. E o desenho, muito bonito para completar, deu gosto vestir.


Oito da matina a turma veio para a concentração e o aquecimento, mas o que mais se via era uma alegria muito grande. Um sentimento de que era bom estar ali foi se tornando a marca mais expressiva do momento, o ambiente foi se tornando muito emotivo.

Partiu a turma da corrida dos dez quilômetros, em seguida seria a nossa vez, eu sempre via estes eventos pela televisão, confesso estava encantado com a situação, mais ainda com a “sobra” de uma camiseta permitindo a “inscrição”, em tempo, de mais uma competidora que iria comigo. Faltavam ainda quinze minutos, a concentração para a partida gerou uma tensão inesperada para um grupo que não iria competir. Reinava inteira confiança, tudo parecia muito organizado e adequado. Nesta hora estávamos garantidos com relação ao clima, não havia mais aquela ameaça da chuva, ela tinha causado preocupação por volta de sete horas com uma garoa. Um caminhante partiu decidido com um guarda- chuva gigante, quem poderia prever o clima, eu teria jogado fora o traste inútil para a ocasião, mas ele o manteve sem reclamar.


Zerou o cronômetro digital, seguimos o grupo, de certa forma nos sentimos como passistas de escola de samba, de repente nós estávamos desfilando na avenida cheia de música, colorida com tendas, divisores, um carro de som animava os caminhantes com músicas divertidas, essas de academia. Depois da “bateria” vinha o abre-alas constituído de ciclistas e orientadores. Nós, também, fantasiados com roupas de esportistas e pequenos adereços representados pelas milhares de máquinas digitais, bonés e cintos de utilidades.


Num cenário assim constituído começamos a fazer evoluções, levantar os braços conforme a música, abanando para as pessoas dos prédios e arquibancadas, estávamos atuando, o público reagia e fazia também uma função de platéia, olhava e batia palmas interagindo de modo surpreendente.

Os primeiros três km foram cumpridos assim numa brincadeira só, então numa esquina meio que deu um rolo, amontoou um pouco, aí vimos que a galera sedenta avançou sobre umas caixas de papelão que foram destruídas em segundos. Eram embalagens de copos de água mineral, aqui mais uma vez fizemos o papel de bravos competidores e saímos tomando água de modo teatral, mais uma vez como se vê nas maratonas. Parecia o primeiro ponto meio improvisado, mais adiante passamos por tanques com gelo e copos de água fresquinha, foi mal, nós tínhamos feito, digamos assim, uma batalha campal por copos de água quente, que fazer. Na briga feia ainda perdemos um tempo precioso, ficamos para trás do pelotão principal, era uma subida e ninguém tava aí para dar uma acelerada, era o km 4.















Cansou a jornada, então nova onda de euforia percorre os atletas, agora o pórtico tem uma faixa que diz CHEGADA, espécie de praça da apoteose, nos sentimos recompensados com a manifestação de carinho da comunidade, emoção por uma singela conquista. Na área da dispersão fizemos as últimas fotos com medalhas de participação e ficamos por alí valorizando e consumindo frutas.
Queremos registrar um sincero agradecimento pelo evento em sí, foi um tempo de felicidade, simples e breve como são estas coisas.
abraços
Selso






quarta-feira, 15 de outubro de 2008

OUTRA GREVE COMO ESTA E ESTAREI ACABADO

Greve nacional, já é a segunda semana, parecia que ia bem, todo dia assembléia no sindicato, depois um chopp e conversas gerais. Complicaram-se as coisas, acompanhe o relato de um simples dia.

Primeiro corri um pouco na canaleta do bi-articulado (se você não é de Curitiba merece uma explicação: trata-se do corredor de ônibus local), os residentes apreciam correr por ali, cheguei com uma garrafa de água e me atirei no sofá. Preguiça geral, fiquei zapeando nos canais da TV a cabo.

Sem experiência em folguedos, deixei a tela aberta , foi quando chegou sentença “precisa arrumar um pouco a casa”. Não estava preparado para aquele duro teste. Devia ter dito de cara, tem reunião para o plano de contingência. Começou a luta, empurra tudo que é possível para os cantos, limpa a poeira, passa um pano úmido com um produto qualquer de limpeza, nem vou imaginar qual é, tem dezenas, para cozinha, piso, banheiro, vidros, gorduras, roupa leve, tira- manchas, amaciante e tantos mais. Acaba com outro produto, é para dar um cheirinho. Esportivo, fui para a atividade, um apto que eu chamo de super mini, não pode ser tão difícil, logo termina, negar ajuda não é, digamos, prudente. O conceito de limpeza e organização que eu tinha sofreu golpe fulminante, “não é assim” e pronto lá veio monstruoso retrabalho, lembra o que significa esta palavra? Foi uma provação geral para enfim receber um “de acordo” na minúscula salinha de estar. Enquanto isto intermináveis procedimentos estavam em curso no banheiro, eu fiz de conta que estava atarefado com a salinha e nem apareci, só cuidava o vai e vem atrás dos inúmeros produtos.

Desolado olhei para a cozinha, coisas do jantar anterior e café, amontoados. Nem esperei ordem, fui lavar, mas descuidado molhei o chão que ficou cheio de marcas de chinelas para todo lado. Mais encrenca, não estava previsto, além disto tinha muitas regras para o quesito das louças, copos de vinho tem de ficar em cima de um pano seco. Eu tentei secar imediatamente, não deu certo, encheram de fiapinhos, gerou inconsistência.

“Já que você está aqui”, quando ouvir esta frase, levante-se prontamente e saia em disparada, é claro que vem convocação para uma tarefa qualquer. Por exemplo, já viu como pesam estes colchões modernosos, tinha que virar o sacana, balançou, ameaçou derrubar tudo, resultando em lesão perigosa nas costas. A lida da casa ainda estendeu-se por largo tempo, dei por resolvida a minha parte e liguei a TV de novo, debaixo de uma chuva de protestos.

Chegamos tarde no “kilo” para o almoço, numa delicada conversa, se existe coisa que enerva as mulheres modernas é arrumação na casa, qualquer expressão que passe de um “pois é” pode ocasionar uma tempestade tropical.

Queria voltar para casa, o sol caprichoso entra no quarto, é tão gostoso cochilar na sesta. Mas foi preciso, ainda, buscar roupas na lavanderia, um par de botas no sapateiro e pagar o IPTU numa casa lotérica, a fila era gigantesca, bancos em greve já viu não é?

“Sabe que só você faz aquele chimarrãozinho”, assim perdi uma parte dos leões caçando no Serengueti, é o destino.

Arrematei o dia fatídico deixando o leite ferver e derramar sobre o fogão, falha de conformidade que enfurece a mais fleumática das companheiras.

Agora, depois de uma semana de “férias” estou com os nervos em cacos, adiei a aposentadoria para depois de 2014.
Selso Vicente Dalmaso

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

SEU TERRITÓRIO É DE OUTRA PESSOA, TAMBÉM....

Como são as coisas, o destino se encarrega de arranjar sempre novidades. Sabemos que marcha, decidido, o projeto do segundo turno.

Mas que interessante, a mesma estrutura servirá para duas turmas. “It sounds good”, que lindo! “otimiza” o equipamento, não é mesmo? Significa dizer que, por exemplo, o mesmo local vai ser usado em dobro.

No lado prático, tem umas questões. Seu território agora é de outra pessoa, também.

Chegando, “ele” estranha a regulagem da cadeira, ninguém é obrigado a ter 1,90 de altura. Prático, já puxa tudo que é travinha e desenrosca o que mais tiver. Quando você retornar, vê se aproveita alguma coisa.

Em seguida empurra o monitor para léguas de distância, de repente mais jovem, não entende as pessoas que trabalham colado, pensa “deve ser prejudicial”, dá um nervoso, sabe lá. Automaticamente vai tateando aquelas teclas de regulagem do visor alterando tudo.
Outra coisa, levanta a CPU e deixa virada contra a parede da baia. Cada um tem seu modo, claro. Você volta e seu querido micro está zunindo nervosamente.
Um caso especial é o mouse, nem é de acreditar, mas é assim, ele é deixado cuidadosamente do lado do teclado, já vamos falar sobre este último, e na volta está fora do pad e raspa de modo irritante, ou desliza suavemente sobre a areia.
Não esquecemos do teclado, tratado com deferência, é silencioso, novinho. Na balada vai ficando melado de café, cheio de farelo de bolachas, já soa com aquele tec tec dos filmes.
Diferenças de estilo vão se destacando. Seu grampeador, velho companheiro, aparece repleto de grampos retorcidos, parece uma boca de tubarão com dentes espetados para todos os lados. O contrário também é possível, estes dias um lápis perfeitamente apontado estava milagrosamente disponível.
Paciência, a fila anda, um dia o micro fica ligado, mas “trava” numa tela escura, reset nele. Outro dia, assim que liga, manda mensagens, tipo “o micro foi desligado de modo inseguro”, e retorna uma série interminável de janelas “documento recuperado” deseja salvar, sim, salvar suas configurações, sim, ok, Yes, “atualizações concluídas deseja reiniciar agora”, não, não, e assim vai. O trabalho começa, então escutam-se expressões de ódio, “mas que mania de alterar tudo”, ou mais fúria incontida, “onde estão os meus arquivos”, “não salva mais nada”... virou um esporte, todos acham graça.

Já tem um calendário pendurado na parede interna, aparece outro, na frente do teclado, cheio de rabiscos e avisos. Dilema cruel, você joga o seu fora? joga fora o do parceiro? para não ofender deixa os dois por ali, o pessoal passa e não resiste, tome piadinha, precisa de dois.....

Outra coisa, a decoração da baia: reparamos que cada um tem um estilo, mas existem muitas formas de abordagem. Vejamos o costumeiro conflito, a companheira deixa dezenas de “motivos” femininos em destaque. Sua baia é recheada de florzinhas, fitinhas cor de rosa, violetas, mensagens do além e as últimas de um livro qualquer de auto-ajuda. Um bravo exilado, do Sul, toma o lugar, sua motivação é de campos, corridas de cavalos, poesias missioneiras... não combina, não é mesmo. Outro competidor do Sul, atua ali também, é chegado em surf, cercos de tainhas e casquinha de siri. Difícil conciliar com a cultura local...

Existe uma esperança, já se cogita um grande congresso, uma espécie de conciliação de contas, como aqueles famosos grupos para fechar diferenças de balancetes. Ali se formariam turmas para discutir uma forma de convivência, algo capaz de acalmar espíritos sensíveis feridos pela invasão do território.
Os residentes poderiam, assim, conhecer suas “almas gêmeas” de modo a acalmar aquela natural resistência. Um procedimento que equilibraria o fato de que o treinamento preparou, digamos assim, os recrutas, mas os velhos combatentes não estavam alertas para estes detalhes.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

ELES QUEREM DORMIR COM AS VACAS


Insistente noticiário, os fiscais proibiram os peões de dormirem nos galpões, perto do gado, durante a Expointer. Todos os dias entrevistas, comentários.


Descontextualizada a situação virou tema para as mais divertidas piadas, no escritório ouvimos “você viu a gauchada tá no maior desgosto, não pode mais dormir com as vacas”, seguido das mais gostosas risadas, gente ficando tonta de tanto rir.


Eminentes autoridades, não estudaram o caso com profundidade, por exemplo a situação do cabanheiro no preparo de um animal para uma apresentação em certame nacional. Vamos colaborar um pouco neste propósito.

Modernamente o cabanheiro é um verdadeiro especialista, estuda e acompanha o crescimento dos selecionados, é um prático zootecnista. São estrelas cheias de manias e vontades, acostumam e obedecem ao treinador, e reagem à simples aproximação de estranhos, não se pode supor que um terceiro irá revezar à noite no cuidado. Ainda é comum enredarem-se, ficarem estufados pela inatividade, enfim só um experiente profissional mantém em condições um exemplar especial.


Tem outros fatores, é um campeonato, não existe confiança nos outros, não se deixa o “time” sozinho, querem vencer não é um simples esporte, tem dinheiro, negócios envolvidos, deixar os atletas sob risco desnecessário é bem ruim. Sensíveis, os animais sentem qualquer mudança, num torneio leiteiro, por exemplo, qualquer fator externo inesperado pode ser um desastre.


Na prática precisa dobrar a equipe, é simples os animais não podem ficar sozinhos, não podendo dormir por ali, uma parte da equipe tem de ficar acordada. No limite um proprietário resolveu, ele mesmo, passar a noite no galpão perto dos animais, enquanto seu empregado dormia.


Esta situação alterou uma tradição, verdadeira glória para os cabanheiros, passar temporada no parque de exposições, desfilar(eles mesmos) com seus competidores. É, tem uma apresentação, jurados, evolução, notas e troféus, lembra um desfile de escola de samba, existe um público, torcida e imprensa. Comparativamente o treinamento é feito nos galpões de estância, as quadras onde atua o peão. Alegorias e adereços são representados por modismos, jaquetas estilosas, boinas, chapéus, botas e lenços.


Era tudo uma grande festa, cuidar de um campeão, vencer com ele, sim porque se leva uma parte do sucesso. Quando um vence, quem está na órbita leva honrarias da mesma forma, a maior visibilidade é do proprietário, mas o cabanheiro tem méritos reconhecidos.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

ENERGIAS CRUZADAS

É fim de turno, companheiros vão finalmente olhando pela janela, já começam a interessar-se por fenômenos naturais, chuva, temperatura e ventos no meu caso. Cumpriram jornada, tensa, oito horas, telefonemas nervosos, olhos cansados “scaneiam” a tela no exame de tabelas e mensagens. Tudo deveria ser bem resolvido, ali não tem fome, frio ou calor, não existem sem tetos, todos têm assistência, na média muito instruídos, mas existe um fator, o fator humano, reside aí o imponderável.

Como se desenrola esta aventura, um simples dia de trabalho, revela-se um grande complexo, personalidades interagindo numa fina linha de equilíbrio, pequenas coisas se complicam. Grandes análises precisam partir no malote da tarde, mas tem um problema: o ser humano, ele quer atenção, recompensa, realização, afagos, precisa deles. A corporação é gigantesca, mas como recomendava Descartes, dividindo em partes, é como uma série de paróquias. Cada bancada vai se tornando uma entidade, com seus valores, crenças e rituais num sensível balanço todo particular.

Digamos que você precisa falar com alguém, veja, então este ritual de abordagem. Um procedimento recomendado é chegar cautelosamente, fazer alguma evolução para ser notado pelo colega, vale cruzar na frente da luz, parar perto, não muito, abrir alguma pasta , nunca sobre qualquer coisa onde esteja trabalhando, fazer caras e bocas, pode também, um olhar expressivo, coisas assim. An passant, jamais circule sem um maço, no mínimo, de papéis na mão, um ar grave compõe a cena favorável, faz supor que você desenvolve grandiosa tarefa e precisa estudar, ainda mais, a situação. Cumprida esta fase, pode se dirigir, em voz suave ao interlocutor. Altas vozes despertam todos os comentaristas do lugar, várias piadas, olhares irônicos e risadinhas destruirão o cenário que você montou. Na cultura local um assunto comentado em voz alta sugere que várias outras pessoas podem participar do assunto. Por outro lado um clima amistoso e discreto, desperta uma certa inveja, você sai fortalecido, e credencia o amigo como um valorizado consultor, assim que termina sua entrevista o coitado quase sufoca com intensos olhares do tipo “não vai nos contar o que está rolando?”. Quando sair em terreno neutro (corredores em geral) deve cuidar para sempre estar composto, carreiras se perdem por esta falta comum.

Ao falarmos em ritual, é preciso ver como funciona o atendimento dos longos telefonemas. Em geral as pessoas ficam cansadas com uma sequência de diálogos. Claro que já ouviu falar em enriquecimento de tarefa, repare como fazer isto. Uma das coisas piores na vida é não ter importância, assim a primeira coisa que precisa dizer é um comentário ao acaso, “ho ho ligação do diretor logo cedo”, silêncio geral, a bancada inteira vai querer saber do que se trata, estar por fora é fatal neste ambiente. Aqui tem de valorizar, primeiro gire na cadeira fazendo varredura, os companheiros vão como peças de dominó, baixando os olhos para papéis sem valor e depois olham de novo atentos, com um pouco de prática tem-se um movimento de “ola” em estádio de futebol, para melhorar a performance, intercale breves comentários em voz mais alta, tipo, “era a reunião do conselho”, e siga com algumas expressões como “isto é tnt puro”, continuando em sussurros e monossílabos enervantes.

Não esquecemos a expressão “fatiou, avança”, do filme Tropa de Elite. Aqui o tempo está fatiado, a tropa só avança em ondas cuidadosamente estudadas, então existem procedimentos, descrevemos as fatias mais expressivas:
Fatia abertura de jornada – período mágico, com olhos brilhando a moçada vai ligando os equipamentos, olha para os lados, acena alegre, comentários do esporte, trânsito e amenidades. Um comportamento desajustado, é reconhecido facilmente, o mais comum é aquele bravo companheiro disparar temas de fatias de tempo adiantadas. Nesta hora é totalmente desaprovado ingressar em temas difíceis, cenário futuro do preço das commodities, comparado com projeto.

Fatia aquecimento – aqui as principais mensagens foram lidas e, algumas impressas aguardam. Já diminuiu o volume do conversê geral, a concentração aumenta. Ruim nesta hora é comentário tardio de alguma coisa engraçada, cairia melhor na fase anterior.
Fatia do piloto automático – Nossos combatentes estão num ponto de não retorno, prontos para os mais difíceis estudos, rende o trabalho, reuniões nesta hora são o máximo. É tempo de tratar de questões sensíveis. Vai na balada, intercalando uma pequena quebra perto do almoço, pode-se revisar sites de notícias on-line.
Fatia da descompressão – Prepara para a fase que relatamos no início. Inspirada nas maratonas, depois da corrida não se deve parar subitamente, deve-se continuar, ainda em movimentos que vão ficando mais lentos. Permitido, novamente, assuntos alegres e coisas sem importância, como os programas para o fim de semana. Sem condições para temas complicados.

Assim passou o dia, então energias confrontantes faíscam, é o segundo turno, compreensível, abertura e final de jornada vibram de forma diferente.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

O RETORNO



Compromisso no Rio Grande Amado, é formatura na Agronomia, em Pelotas, segunda geração familiar temos de ir. Agenda apertada, escolhemos, modo de dizer, ofertão, primeiro horário para Porto Alegre, meio arriscado, muita neblina por aqui. Mandou bem. Meio de ressaca, tem de acordar às cinco da matina, aliviados fomos manobrando em cima do Rio Guaíba, não demorou alugamos um bravo 1.0 ali na frente do Laçador. Embicamos para o Sul, nosso propósito era lembrar algumas situações e rever lugares, coisa de trinta anos atrás.

Paramos na esquina de Tapes, naquela época este ponto presenciou minha última viagem de carona. Era universitário e visitava um amigo por ali, sem nenhum, chegou a noite e madrugada, embarcamos numa carreta de soja, prometendo acabar com este tipo de aventura, quase se complicou a coisa. Num tempo foi divertido, fazia a rota Pelotas\Porto Alegre, às vezes só para ir a um baile, ou a barzinhos famosos, eu gostava de um ali na ponta da Salgado Filho, mas acabou.
Mais um trecho, chegamos ao Gril, em Camaquã, todo mundo dava um tempo por ali nas viagens era o meio do caminho. Guardo o tempo em que se viajava de “Limousine” era o que seria hoje um microônibus, num motor a gasolina oito cilindros, corria livre a 120 km hora, passava todos pelo caminho. Só depois vieram os famosos Marco Polo, era um case, tinha garçonete, balas, água, café, se a turma da Gol visse. De Camaquã ficou a memória de pesquisa que fizemos, para o Rondon, no primeiro projeto de reforma agrária do Sul do Brasil, no conhecido Banhado do Colégio. É obra do Leonel Brizola, lembrou deste nome, por volta de 1967 se inaugurou a Barragem do Arroio Duro que iniciou o plano. Era de lotes de lavoura de arroz, só vendo para entender a complexidade.

Continua a aventura, passam caminhões com casca de acácia negra, é para extrair tanino, são assustadores, imensas cargas sem proteção vão deixando cair feixes pelo caminho. E mais aquelas carretas de farelo de soja que vão para o porto de Rio Grande, antes chamado de Super Porto do Rio Grande, a gauchada sempre se achando. Lá mandamos buscar a primeira calça LEE, eu tinha 18 anos. Quem trouxe foi um colega que morava no Rio Grande, ele tinha várias, a gente ficava com inveja, custava uma nota, os marinheiros vendiam. Usei, bem assim, um mês inteiro, depois foi lavada por mim mesmo, morava no colégio interno. Começou a ficar desbotada, mais 30 dias e outra lavada, ficou no ponto, finalmente eu me sentia um “igual”. No sábado vinha para o centro, primeiro na lanchonete Forno, depois cinema. Fui conferir, o Forno não existe mais.

Noite de sábado, festa, sessão solene, é a segunda geração dos Dalmaso na Agronomia da Ufpel, inteirou três nomes, não demora, mais um. Visitei a árvore que nossa turma plantou, cada grupo de formandos, simbolicamente deixa uma pequena árvore identificada, no caso, “Formandos dezembro de 1977”. Uma vez mostrei para um paulista, ele fez comentário tipicamente debochado comparando com lápides de um cemitério, francamente ofensivo sem levar em conta o contexto da tradição local, a escola de agronomia tem 125 anos, eu estou no livro do centenário.

Renovei meu juramento, é costume, nas solenidades, os agrônomos presentes são convidados a levantar e repetir as palavras junto com os formandos.

Depois delicadas iguarias, tripa gorda, morcilha, no El Paisano, parrila temática Uruguaia, maioria das opções é de cordeiros. Acompanhou famosa cerveja, em litros, recém agora nossa pátria oferece a primeira marca neste volume.

No remate, baile até o conjunto parar como tem de ser, chegamos “com o pala em tiras” , além de extenuados pela função toda, assim que o avião estabilizou um relâmpago alumiou o céu das dez da noite e mergulhamos em assustadora turbulência por meia hora. A galera em respeitoso silêncio já via próximos os telhados quando a nossa nave acelerou em baixa altitude e foi para os céus de novo, o que teria havido. Enfim veio aviso que havia (pode?) um avião taxiando na pista, volta e descemos quadrado, um baque e freadas bruscas.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

ELEGÂNCIA VEGETAL

“Você não tem um hobby”, disse o meu filho. Ele afirmava que eu devia me preparar para a aposentadoria, ter alguma coisa para fazer. Não tinha mesmo.

Todos os anos, no inverno eu partia para uma tarefa específica, podar as plantas da casa do meu pai, 800 km até a fronteira do Uruguai. Muitos tipos de fruteiras e mais outras para sombra e mesmo ornamentais. Completava o serviço no verão com mais cuidados. Também me iniciei no plantio e acompanhamento de várias espécies. Recebia telefonemas, as parreiras estão no ponto, pode vir podar, tem muito mais serviço. Peguei prática.

De repente era um hobby, agora tenho saudade das árvores que plantei, as minhas árvores. Retorno e visito as companheiras, cuido delas, vejo como se desenvolveram, acerto tendências, limpo os pontos de contaminação, focos de insetos. Desenvolvemos o conceito de elegância vegetal, gostamos delas sempre bonitas.

Sempre que vou visitar um amigo, sem avisar levo a minha tesoura importada, japonesa, aço fino e um serrote especial. Ficamos por ali conversando e tomando mate, eu, claro imediatamente avalio o jardim e quintal. Assim como por acaso pergunto, quem sabe dá uma “ajeitada” naquela velha bergamoteira. Pronto já arrumo atividade e passo horas na empreitada.

Meu compadre, casa nova, grande quintal recheado de espécies para fruta e embelezamento, avisou “pode vir num fim de semana, já garanti um vinho de boa safra”. Imagine, terminou o expediente na sexta-feira, minha “assistente” passou de carro e zarpamos para o Oeste, 540 km, chegamos tarde da noite.

No dia seguinte cuidadoso ritual, primeiro o tal chimarrão, cadeiras no gramado, enquanto rola uma conversa tranqüila analisamos preliminarmente a situação. Antes de iniciar a poda é preciso contextualizar, reparar o conjunto, o papel que aquela planta exerce no sítio, quintal ou jardim.
Depois do café, chega o momento da ação. Trazemos as ferramentas, luvas e óculos de proteção. Alegres e dispostos combinamos a sequência, da entrada da casa para o fundo do quintal. Primeiro duas laranjeiras, iniciamos limpando todos os ramos baixos, atravessados, mortos e doentes. Depois um “clareamento” da copa, ficando bem arejada. Em seguida nos afastamos para olhar, qual artista para contemplar sua obra, e arrematamos com típicos comentários do tipo “ficou bem bom” e coisas assim. Desta forma vamos passando em várias árvores, sempre uma abordagem diferente para cada tipo, estado atual e estimativa de produção. E tome expressões “vai produzir muito”, “agora vai se recuperar”, e outras sempre se achando.

Complicou um pouco a falta de escada, custou quase uma tese para desestimular o compadre que fez uma espécie de escada de corda para empoleirar-se num araçazeiro. Sendo um alto executivo eu não queria que ocorresse qualquer tipo de acidente, destes que a gente vê na imprensa e que prejudicam a carreira de muitas pessoas.
Deu certo completamos o trabalho já passando o meio dia. Logo chegaram tábuas de frios delicados e gelada cerveja. O vinho fino ficou para o jantar.
Este é um hobby, digamos assim, físico, de atividade, interação com o ambiente e as pessoas.
Tenho, também, um hobby intelectual, escrever, só que este é solitário.




domingo, 3 de agosto de 2008

SOLIDÃO CONSENTIDA

Por essas coisas do destino, tive de conviver em ambientes com outras pessoas, colégios internos, alojamentos de companhias, centros de treinamento. Restaurantes coletivos, compartilhamento de mesas com estranhos.

Não me acostumei, sempre tive, um certo gosto pela solidão. Talvez por isto eu não me adapte com multidões, estádios nem pensar. Shows em pé, não vou mais. Prefiro almoçar sozinho, depois vou pela rua ensolarada, pensando, raciocinando, passo na fruteira e em seguida caminho um pouco cuspindo sementes de bergamotas.

Nas viagens gosto de ir sem conversar, só com os pensamentos. De resto “o viajar” se tornou uma espécie de terapia. A regra do homem em trânsito é só relaxar quando está embarcado. Cumprida esta condição, é tempo de refletir, organizar as idéias e planejar. Consigo isto em completo silêncio.

Estando só podemos reparar melhor nas pessoas, seu comportamento. Um banco na frente da praia é muito bom, mas tem uma série de importunos oferecendo coisas. No exterior gostava de sentar numa praça e ficar olhando simplesmente a rua e as pessoas, sem sofrer assédio de ninguém.

Era bom o tempo em que cada profissional tinha a “sua mesa” de trabalho. Estas bancadas, ditas modernas, afetam a personalidade e tiram a privacidade. Sua tela de computador vira uma espécie de vitrine. Também é constrangedor porque ao olhar para o lado lá está o rascunho que seu colega está redigindo. Outra coisa no falar ao telefone, temos de tomar uma atitude neutra em tudo, todos ouvem o que se fala.

Reagindo a isto cada um cria um tipo de “decoração” imprimindo marca qualquer de sua personalidade. Em viagem a Treze Tílias, muitos anos atrás fiquei impressionado com a vocação daquele povo, originário da Áustria, para esculturas em madeira. A cidade promove um torneio juvenil de xadrez, todos os anos, minha filha era da equipe de Lages. Tudo em motivos religiosos, a figura do Cristo aparecia em muitas formas. Perto da praça entrei em pequeno ateliê, pouco maior que uma garagem, tinha uma prancha de madeira, várias obras em andamento e outras prontas. Uma artista trabalhava em nó de pinho, sua especialidade, fiquei muito impressionado. Ela explicou que o nó de pinho figurava no imaginário popular como algo que representa a eternidade, se mantém por muitas décadas depois que o pinheiro morre, ele mesmo, muitas vezes, centenário. Ela só fazia a limpeza externa e protegia com verniz e cera, serrava a parte inferior formando a base e esculpia uma figura do Cristo crucificado, muito delicada e linda dentro de um nicho. Comprei uma delas e é a única decoração da minha bancada, fica ao lado do computador.

É um elemento natural, rústico por um lado, mas tendo uma delicada figura cuidadosamente trabalhada. Todo dia eu olho, passo a mão tirando o pó e faço uma oração singela, sei que é preciso coragem para enfrentar o dia a dia, a imagem me conforta.

A artista gravou seu nome, é Mariana Taller de Treze Tílias(SC).

domingo, 20 de julho de 2008

NEM FAMA NEM FORTUNA

Chegou convite, 25 anos da formatura, a universidade nos concedeu uma comenda, fomos jubilados.

Mais um pouco, 30 anos de formado, faz lembrar uma crônica de alguém, “assim se passaram trinta anos” eu imaginava que era do José Luiz Borges, na web, não consegui confirmar.

Podemos dizer sem vergonha, não atingimos fama ou fortuna. Num tempo chegamos a sentir aquele chamamento para competir, fazer carreira, um impulso que nos remete a querer primeiro a fama, depois a fortuna. Gostinho da fama, modestamente, chegamos a ter amostra de como é, escrevia no jornal semanal e fazia comentários numa rádio. Então, veio estação de TV para nosso município, aproveitando uma reunião no hotel da cidade um repórter apareceu e queria entrevista, aceitei. No final da outra semana tinha festa da associação dos agrônomos, eu era secretário, estava por lá. O pessoal começou a dizer, então agora é artista, eu nem sabia, a TV colocou a minha entrevista como propaganda do jornal local, dizia assim “notícias, entrevistas e nesta parte eu estava comentando a reunião” foi legal a turma se divertia de montão. Assim quando tinha seca, granizo, neve, os repórteres vinham saber se tinha influência na agropecuária da região. Tava encaminhada esta parte.

Naquela ansiedade para resolver a outra questão, a da fortuna, lembram, eu inventei de trocar de trabalho, troquei, não deu riqueza como eu queria, em compensação lá se foi a incipiente fama que eu gostava. Disseram aqui, não tem espaço para estes sonhos, pode pegar sua mesa e pronto, pior, quando fui conferir mal chegava ao salário anterior. Ganhar pouco já foi de matar, mas perder o prestígio cuidadosamente construído na comunidade doeu de verdade. No limite fiquei baqueado, o médico disse é stress, que coisa, me deu uns calmantes. Ataca daqui e dali, fui parar numa academia de yoga, aquilo sim representou fortuna. Minha mestra, tinha fama, natural, pessoa encantadora, aprendi dura lição, tive de reconstruir a estima a partir da humildade, trabalho simples e disciplina.

Nesta lida passaram os trinta anos, fama e riqueza se converteram em satisfação com as mais singelas coisas, contemplação da natureza, estar com a família, rir, partir em viagens distantes, retornar. Também não deixamos nada para trás, “levamos parelho”, sem esta de dizer “quando me aposentar vou descansar”.

O destino quis assim, ainda não acabou, nos sentimos desafiados a continuar avançando, quem sabe, um dia, a fama pelo menos.

domingo, 22 de junho de 2008

GOSTO DE POLÍTICA

Parece estranho, gosto de discurso. Sou capaz de ficar horas vendo a campanha eleitoral, um líder falando com elegância me atrai. Eu assisti a muitos discursos do velho Brizola, quando ele falava na campanha eu assistia, até o fim, os discursos. Tenho na memória o Tancredo Neves dizendo “não vamos nos dispersar”.

Participei de muitas inaugurações, abertura de exposições agropecuárias e visitas dos governadores. Apreciava ver os líderes que tinham tranqüilidade e capacidade de dominar a platéia que ficava encantada. Acostumei com aquele protocolo, chega equipe precursora, assessores, secretárias, que vão anotando as autoridades presentes. Foi nestes momentos que aprendi a ver os famosos tapinhas nas costas, inimigos se abraçando, o tio Deba me disse um dia “em política o pior inimigo é o próprio companheiro”.
Nestas ocasiões reparei que o povo, fala mal, mas adora os políticos, quer receber um aceno, um aperto de mão, um olhar. Se exibe, diz que os políticos foram á sua casa pedir apoio. Fica muito contente quando o prefeito, o vereador, o deputado comparece a uma reunião, toma um cafezinho com eles. Reunem-se alegremente e fazem debates, apostam nos candidatos, gostam de dizer que entendem de política, afirmam que seus candidatos vencem por grande margem de votos, torcem por eles, trabalham voluntariamente, emprestam as casas e fazendas para encontros, churrascos. Dizem orgulhosos que estão trabalhando para o candidato do local. Ser amigo dos políticos conta muito nas comunidades, representa poder e influência. Muitas vezes se afirmava, precisamos de um bom político, agora não temos deputado, coisas assim.
É preciso um numeroso grupo de simpatizantes cada vez que um político vai a uma reunião, o assedio é cruel, mais de cinco minutos e já começam os pedidos, “tenho um genro, utalo homi bão, quem sabe arranja um....” hora crítica, o asessor deve imediatamente interrromper com um celular na mão, dizendo é o senador, o político com um aspecto grave começa a conversar, se afasta sugerindo um assunto sigiloso e importante e faz um aceno, anota aí. Mais um caso, e a equipe tem de apelar, “tá na hora do avião” e lá se vão, voltarão em cinco anos ao mesmo local. Questão de honra político sempre chega em cima da hora, ou atrasado, depois que a equipe já verificou tudo é claro. Está sempre com pressa, o mestre de cerimônias, em geral um amigo, já vai avisando que o importante líder tem um compromisso a seguir, poupa assim o homem das desculpas e previne a fuga dos pedidos importunos.
Então a autoridade maior vai falar. Os assistentes ficam prestando atenção, respeitam o homem, ninguém precisa pedir silêncio a reverência é natural. Ele começa citando as lideranças, depois vai ligando os assuntos e por fim, bem treinado, atinge um ponto que a platéia espera, acelera a entonação das palavras e por fim deixa um espaço para os aplausos. Isto acontece na hora em que se anuncia a novidade, um novo projeto, uma lei, sempre tem uma novidade em andamento, você já ouviu falar de carta na manga, os ouvintes esperam isto porque não atender.
Inicia com uma folha na mão, com os nomes, em seguida, larga aquele papel e domina tudo sem qualquer tipo de ajuda, é lindo de ver.
Por conta da atividade profissional, ao longo dos anos, fiz muitas e muitas apresentações, as conhecidas palestras. Por isto tive de estudar o assunto, comprei livros, fiz alguns cursos que envolviam demonstrações, motivação para algum tipo de resultado. Uma parte do aprendizado foi prático vendo a política funcionar. Gosto da política.

terça-feira, 17 de junho de 2008

IMAGEM PERCEBIDA

Velha barbearia na Boca Maldita, um rodado companheiro dá uma retocada no cabelo. O que vai ser, máquina dois nos lados e uma ajeitada manual no resto, nem pensar em cortes modernosos.
Rola um conversê alegre, bobagens em geral, aquilo que se fala, para todos, frio, futebol. Entra e sai de gente, aqueles clientes que se acham, corto aqui ha vinte anos, dizem, essas coisas. Os barbeiros se gabando, também, contam fofocas de gente famosa, ou daqueles famosos da paróquia, casos e mais casos. Para conhecer um lugar, fique por ali esperando sua vez, em meia hora saberá de muitas coisas, iniciar conversa é muito simples. Manifeste surpresa com qualquer coisa da rua, a razão do apelido Boca Maldita, por exemplo, diga que ficou curioso, umas pessoas estavam falando. Pronto meu amigo, você passará o dia contente, cada um, dono de cadeira, correrá para contar a “sua história”. Enquanto um fala, tem uma fila de outros esperando para mostrar outra versão e ficarão discutindo horas e horas. O amigo entendeu, manifeste surpresa, curiosidade, é arriscado achar graça, criticar, você pode sofrer a pena máxima do lugar que é o silêncio, nada mais cruel.


Utilize esta prática para conversar com os motoristas de taxi, eu tava um dia destes no Tamboré em Sampa, precisava agüentar um táxi mais de quarenta minutos até Congonhas, não tive dúvidas, uma conversa mole passa o tempo, perguntei por uma ponte cheia de cabos pendurados que tinha visto na TV. Daí em diante foi um tal de abobrinhas, a respeito da corrupção da obra, o resultado, fiquei sabendo onde caiu a estação do metro e tudo mais. Quando vi tava chegando.
Voltando ao cabelo finalizando, o serviço, solicito um aproach, nas sobrancelhas, ouvidos, nariz, impressionante, precisa, sua aparência se arruína em poucas semanas. Começo a entender o porquê das mulheres gastarem metade de sua existência cuidando de si mesmas.


De repente, chocante, a imagem que o barbeiro mostra, de como o corte ficou na parte de traz da cabeça, é, se podemos assim nos expressar, totalmente desaprovada. Não me refiro ao trabalho esmerado do profissional, mas a imagem no espelho, realidade brutal, causa estragos no amor próprio do mais fleumático companheiro.


Quase não acredito, pareço assim, melhor sou assim, quero dizer fiquei desta forma.


Me ocorre uma expressão que escuto nos famosos cursos de desenvolvimento, é a conhecida “Imagem percebida”. Funciona assim, não importa o que você pensa sobre a empresa, o importante é como a firma é percebida pelas pessoas.


Eu tinha uma Imagem percebida melhor de mim mesmo, me ocorre pensar é assim que as pessoas me vêem, será que eles têm a mesma percepção.


Vou gastar mais tempo cuidando de mim mesmo, se as mulheres podem.

domingo, 15 de junho de 2008

INVEJA SINCERA

Sentimento sincero, intenso, acompanha o homem, sempre.

Falsamente queremos iludir os outros, e a nós mesmos, reprimindo este impulso milenar.

É válido sentir inveja, uma energia estudada desde a antiguidade, mostrando os imperadores cobiçando o reino alheio.

Precisamos aprender a lidar com os pensamentos invejosos.

Que ramo científico poderia nos ajudar, a sociologia, talvez.
A religião tenta, vamos reconhecer, mas é uma abordagem maniqueísta

É a inveja que faz um pobre trabalhador exaurir-se em horas extras. Um político olha ansioso o próximo cargo.

Assim se comporta o ser humano, quer o que não possui.

Fui olhar um campo que um conhecido comprou, não demorou e nos apoiamos na cerca divisória e passamos um tempão invejando os pastos do vizinho.

Aqui encontramos uma explicação de como o comunismo faliu, esta semana acabou a igualdade de salários em Cuba, prática que destruiu com a pobre nação. Uma sociedade igual, não tem inveja, logo ninguém precisa fazer nada melhor que o outro, você não vai ganhar mais dinheiro, ter casas melhores, já pensou nisto, é de enlouquecer. Lembra das fotos antigas de milhares de chineses todos com a mesma roupa. Claro que não deu certo.

Sinto inveja quando vejo um bom livro, queria ser capaz de fazer igual.

É um sentimento construtivo, sinaliza que a gente quer ser melhor.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

MEIA LUA CRESCENTE

Gauchinho da fronteira aventurou-se na praia, sem prática, passou manhã em alegre função, sol e mar. Não era costume ficar em atividade, com pouca roupa, naquela olheira de sol. De certo é assim mesmo, achou graça naquela moçada, biquínis lindos, sentia atração pela “parte de cima” .
Parecia que ia ficar bonito, igual aqueles exibidos residentes. Vindo de campos, quando tirava a camisa parecia um nobre inglês, sangue azul correndo em veias salientes na pele branquela. Não tava dando certo, depois do banho, explodiu a realidade cruel, queimada completa,de segundo grau. Febre, dor, solução “local” passa vinagre, caladril, foi por fim levar um puta xingão do medico do pronto socorro. Pagou geral, quase uma semana, de água mesmo conhecia os banhos de açudão em final de tarde.
Ressabiado, agora trata o mar como numa guerra de guerrilha, saí para o banho e logo se enfurna em quiosques, guarda-sóis, varandas de bar. Aprendeu o valor das camisetas e chapéus, não importa a moda, o que interessa é proteção. Até pegou ponto, aprendeu a lidar.
Habitué, na altura do quiosque número oito. Ficou chegado com o sistema. Batata, batata, batataaaa, é picolé....., cerveja, coca, água, sanduíche natural. Todo dia baiano, cabelo rastafári, oferece tatoo, tatoo, hena, hena. Um álbum com amostras de desenhos, dragão, borboleta, beija-flor, rosa, hummm. Não gostou dos modelos, presunçoso, alegou, já tenho muitas marcas, da vida. O baiano deixou para lá, cansado de “turista faceiro”. É assim, insistiu, fui pisado pelo cavalo, em cima da alparagata, dedão sem unha, feio. Peito afundado, passou uma carroça em cima, salvo por milagre. Foi abrir um caroço de pêssego e a faca cravou na palma da mão, coisa de guri. Dedo mindinho, torto, trator sem direção hidráulica deu um safanão quando a roda atingiu um cupim. No colégio tinha apelido de “pé de matar formiga em carreiro” um pezão largo e comprido, de tanto andar descalço no meio do barro da lavoura de arroz. Braços e rosto tomados por sinais, o pessoal dizia que eram “manchas solares”, agravou-se a situação até que um médico mandou “destatuar” o homem. Num inverno brabo a tia foi botar água fervendo em uma garrafa para aquecer a cama, a garrafa quebrou e derramou água fervente em cima dos dois joelhos, produzindo copiosa lesão.
Chegamos, então, no caso de um boi que refugou na entrada da pêra e atropelou levando tudo por diante. Era um pampeano brasino, aspado, tipo guzerá, passou num pulo assustador bufando, na confusão o braço esquerdo do companheiro levou chifrada. Ralou em curva a pele, deixando larga marca registrada. A meia lua crescente, sinal da lida, espécie de tatuagem rústica, não apaga nem com laser. Agora o gauchinho, não anda sem camisa, tem vergonha do peito afundado, em compensação só camisa sem manga, capaz de percorrer shoppings inteiros para achar uma bonita, tem de realçar meia lua crescente no braço esquerdo, começa na ponta de cima do bíceps e percorre lateralmente o encontrar o tríceps, explica orgulhoso.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

CAOS AÉREO

Morava na Bomba de Candiota, estação ferroviária 60 km de Bagé, sem luz elétrica mas todos gostavam de ler, uma vez por ano, depois da colheita tinha visita na casa do vovô Rosso em Caçapava do Sul, minha terra natal. Uma semana inteira fazendo tachos de figada, geléia de uva e perada. Meu serviço sempre foi fazer fogo e mexer o tacho durante horas com uma gigantesca pá de madeira, no início a chimia pulava e saltava queimando os braços. Na volta, a camionete vinha carregada de coisas e, principalmente, todos os exemplares antigos da Seleções do Readers Digest, a tia assinava, e mais todas as revistas antigas de O Cruzeiro e outras. Alguns anos depois um dono de posto de gasolina, amigo nosso, soube deste vício, e nos deu uma imensa coleção de livrinhos de faroeste, alguém sabe o que é isto, se acreditam eu lia um por dia, Ei Jack !!!

A hora de ler ficava para a sesta, a popular sestia, durava até duas horas no verão. Como o dia é muito longo no verão do Sul, não havia pressa, podia ler, dormir, e comer melancia. Todos liam, as revistas iam passando, ao final cada uma era lida e relida várias vezes. Uma propaganda me encantava era da Varig, geralmente tinha uma ilustração de elegantes pessoas e alguma coisa relacionada com ter muita classe, ou pessoas de classe é que escolhiam a companhia. Certo que a foto ou ilustração incluía cena do aeroporto. No meu imaginário voar era uma coisa para pessoas muito ricas, influentes e poderosas. Aquelas propagandas causavam grande admiração e influenciam meu comportamento até hoje. Posso dizer que a propaganda funcionava. Esta curiosidade me levava a olhar instintivamente para os aviões passando. Mais tarde eu gostava de ir para os aeroportos, geralmente quando chegavam políticos e conhecidos.

Passou o tempo, cheguei á universidade, imediatamente passei a me inscrever em toda a atividade do Projeto Rondon. Então veio a primeira viagem de verdade, Porto Alegre a Goiânia, pela Varig acreditem. Novato, aprendi umas regras, passei frio. Serviam sucos, um estudante de veterinária, o Jonas, pediu suco de tomate, se deu mal, e refeição quentinha muito legal. Um serviço muito atencioso, dava gosto participar daquele mundo, as ilusões dos comerciais tinham certo sentido. Muitos anos depois, sexta-feira, telex urgente, segunda-feira curso em Brasília, quinze dias, a companhia escolhida foi Varig embarquei em Curitiba, viajava a noite toda de ônibus, de Lages(SC).Lembro de uma vez, inverno brabo, amanheceu zero grau geando, no avião tirei a pesada jaqueta de couro, quando cheguei em Recife, descia no pátio do aeroporto, aquele bafão, trinta graus em pleno julho. Resultado no hotel eu estava carregado de abrigos na mão e suando direto.

Veio o tempo dos cursos “à distância”(hoje se chamam MBA), perto de 400 h, provas duas vezes por ano. Escolhi um em Minas Gerais, mais uma vez embarquei em Curitiba até Rio de Janeiro, depois Belo Horizonte era um 727, estiloso, gostava dele, anotava os modelos, dois anos seguidos. Aprendi mais uma coisinha, numa destas lá se foi, para sempre, linda máquina fotográfica reflex, lentes intercambiáveis e alguns filtros, estava na bagagem despachada. Numa das viagens, atraso, perdi a conexão, fui na companhia e, outra lição, ouvi não somos responsáveis por espera de outras empresas, a regra é sempre conexão com a mesma companhia.
Nesta altura eu tinha, rodado um tanto, cada local que passava, conhecia cada detalhe do aeroporto, ia para o deck, ver o movimento, passeava nas lojas, chegava bem cedo para “viver” aquele clima. Gostava das escalas, fiquei acostumado com a rotina, cada caminhão que chega, trator com malas, aquele vai e vem de aeromoças.
Aquelas propagandas do Seleções, sempre recorrentes, cada assunto relacionado nos jornais dou uma olhada. Pois assim iniciaram comentários sobre problemas, crises, dívidas, renegociações relacionadas com minha companhia preferida. Um vazio no setor, foi-se a Vasp, Transbrasil, entraram novos atores, preços atrativos. Cabe um comentário favorável, surgiram as promoções, decidido, incluí São Paulo na rota turística, museus, pinacoteca, gigantescas livrarias e sebos, minha filha fazia mestrado, achamos todos os livros do John Steinbeck em inglês, era preciso, outro aprendizado, acabaram as refeições quentes, nem um cafezinho, o preço era de ônibus leito.
Um dia anunciaram, balcões vazios, daquela cor inconfundível, parecia incrível mas estava acontecendo.

A vida continua, precisava ir a São Paulo, olhava a internet, de repente, aquele símbolo e uma nota, oferta especial, feriadão na metrópole, R$ 110,00 ida e volta, cliquei imediatamente. Enfim novamente, nos ares, literalmente, voltamos a ver a rosa dos ventos, sabemos é quase só o nome de fantasia, os problemas ficaram para trás. Ainda assim, o nome é forte, a marca que encantou a nação, e, porque não dizer, era um genuíno orgulho do Rio Grande Amado, podem acreditar serviu um singelo sanduíche quentinho. No exterior era quase uma embaixada, dava alegria ver. Me aventurei em viagem externa pela Transbrasil, que coisa, não tinha equipe de terra, “terceirizava” o serviço de outra empresa, não falavam português, na maior parte o balcão, simplesmente o último, longe, ficava abandonado. Outra lição, na viagem seguinte escolhi a companhia nativa do país visitado, ours-concurs, petiscos delicados, vinhos encantadores, entrada, prato principal e sobremesa, foi lindo. Vacilei, oferta, e lá fui para a terra dos hermanos, o serviço, de novo um caso, a viagem era curta, tinha partido da capital pampeana.

Na pátria mãe foi uma década de sandubas gelados, amendoins e barra de cereais, ufa. Deus seja louvado, a fila andou, finalmente algo “quente”, faz lembrar antigo filme do John Wayne com uma expressão, “não se deixa um viajante partir sem uma refeição quente no estômago”.

terça-feira, 27 de maio de 2008

VIAGEM NÚMERO 57



Concorrência na empresa, entrevista, curriculum, amostras de trabalhos produzidos. Competição de verdade, mas ao final deu certo. Ajusta situações, analisa, e me instalei na Ilha de Santa Catarina, bem contente, mês dezembro. Queria outro lugar, imediações do centro, fui voto vencido, acontece que a proximidade da universidade pesou, e depois, disseram “veja que legal o Titri é ali” bom para mim eu poderia ir de ônibus.

Tinha um propósito de ir acompanhando os acontecimentos da ilha, visitando os restaurantes, locais típicos, passando alguns dias em cada praia, tudo com calma. Fizemos desta forma.
Verão muito louco, três meses beirando 35 graus, no geral. Mas chegou o outono, um dia passando pelo mercado público, confusão, empurra daqui e tal, é que tinha acabado o “defeso” do camarão, vale dizer liberou a pesca do ano. Todas as bancas cheias desta paixão dos catarinas, fresquinhos, grados. Uma festa geral, claro levei uns quilos, no bafo leva uns dez minutos, acompanha cerveja bem gelada.

Previsão do tempo, frente fria pode trazer neve ou geada. Confirmou, era princípio de maio, junto com o frio vieram as tainhas. Primeiro cardume “encostou” em Ingleses, milhares, cobertura da TV e tudo. Foi um mês de festa, é mais um amor local, ta ali correndo firme com os camarões e curiós. No mercado é que tem notícia se a safra é boa, se é grada, ovada essas coisas. Os pescadores da ilha insistem a tainha deles é que é boa, pescada na beira da praia, não fica uma semana no porão das traineiras que descem até a barra da lagoa. Não precisa correr ao mercado, simplesmente todos os restaurantes incluem este peixe no cardápio, com sorte você encontra uma tainha assada com recheio especial da ova e temperos secretos.

Meados de maio, “o que tá dando agora é enchova”, pode ser, em todos os restaurantes tem grandes cartazes enchova grelhada para duas pessoas R$ 19,99. Reza a lenda, enchova só em mês sem “r”.

Não há bem que sempre dure, na empresa, a “rádio corredor” fervilhava de nervosos boatos, nossa unidade corria perigo, falava-se em “reestruturação”, palavra provocadora de calafrios na moçada. Entendemos o porquê, nosso local de trabalho era a praça xv de novembro de Florianópolis, ninguém vai embora assim. Então, o que pode dar errado dá, entrou junho e veio mensagem informando, vai fechar a unidade. Tinha reunião pela manhã, choradeira geral, reunião à tarde mais choradeira. Eu não tive dúvida, vou para Curitiba, mas para grande número de colegas foi muito difícil. Esportivo, aluguei base provisória num antigo hotel, bem na Boca Maldita, já era a primeira semana de agosto. Foi muito bom, a Boca é o coração da Urbe, ali refletem as mais diversas ocorrências e manifestações. Todo dia depois do expediente eu zanzava um pouco pela região, visitava a livraria, uns sebos, li oito livros.
Nesta época eu viajava todo o fim de semana para Florianópolis, de ônibus, no horário das 18:30 às sextas e voltava no domingo. Vasculhava todas as semanas as ofertas na ponte aérea mas nada. Começei a contar as viagens, durante a semana no trabalho ficava dizendo fiz minha viagem numero 35, ou mais, cheguei a 57. Meu local preferido era a primeira fila, na frente da grande janela, ia acompanhando as manobras e acontecimentos que fazem da estrada uma entidade muito especial. Deu tempo de ver que pessoas faziam regularmente o trajeto. Chamou a atenção os efeitos da grande crise dos aeroportos, empresários e outros viajantes vinham de avião de São Paulo, continuando de buzao até Florianópolis. Então a gente escutava coisas estranhas para o lugar, pessoas dizendo, “a holding ta com orçamento apertado”, ou semana que vem nos encontramos em Nova York, nosso relatório de vendas tem uma diferenças de vinte milhões este mês e coisas assim. Um dia um companheiro de estrada dormiu, e o celular tocou, a chamada era uma expressão com um palavrão, mais ou menos assim “chi lá vem m...” começou baixinha e aumentou de volume a turma escutando os palavrões com surpresa. Uma passageira ficou, algo como 45 minutos discutindo a relação, falando sobre emoções, o pessoal sonhando com aquele aparelho que desliga os celulares. Tem também uma turma que vai com notebooks e acende as luzes, fica do seu lado naquele tec tec, virando a tela para vc não ver, quase ofensivo.

Eu reparei que fazia parte de um novo grupo de nômades, diferentes, estes nômades modernos, não se mudam, eles percorrem grandes distâncias toda a semana e voltam para suas casas.




sexta-feira, 9 de maio de 2008

Ventos

No Cabral o vento pega mesmo, faz um zumbido arrepiante no prédio. Olho as pessoas lá embaixo curvadas, mãos no bolso, gola das japonas levantadas.
Sempre tive problemas com ventos, quando criança enfrentava geadas, andava descalço, mas sofria com os ventos, frios ou quentes. É compreensível, roupas inadequadas, sem luvas, com tamancas de madeira, duros tempos. Além disto a ética dos imigrantes mandava, não se queixar, arregaçar as mangas literalmente e enfrentar resignadamente a intempérie. Demonstrações de fraqueza eram prontamente desprezadas. Com o tempo passei a monitorar a situação, nos lugares onde vivi eu registrava mentalmente as ocorrências relacionadas com o vento.
Nas férias de julho revezávamos com os empregados trabalhando nos tratores, era época de lavração. Naquele tempo não existiam cabines, o tratorista trabalhava completamente exposto. Foi assim que eu passei a sentir um ódio sincero pelo vento Minuano, gelado, vem do lado do Uruguai. É persistente, não alivia, por dias inteiros, pense no que é dar uma esticada no expediente, digamos até as duas da manhã conforme era necessário. Claro que a gente tentava se proteger, mas o golpe do frio era inevitável. O enregelamento inicia nas mãos que vão “ressecando” de modo cruel. Na seqüência o rosto sofre com o vento inclemente, seca e trinca os lábios, as orelhas e nariz esfriam de verdade, as maçãs do rosto ficam com aquele aspecto queimado. Juntam-se os pés, algumas vezes era possível manter aquecidos com folhas de jornal. Na lavração o trator fazia a volta e o vento, não bastasse ser gelado, atirava no rosto poeira, capim e lama também conforme o local ia mudando.Um ponto sensível eram os joelhos, sentado a calça e ceroula, ficam coladas e se esfriam sem dó, ainda hoje é onde sinto frio neste clima Curitibano.
Quando chegava o verão o problema era outro, o vento Leste, vento da fome, trazia seca, campos calcinados. Depois do almoço, lembro daquele vento quente, bronzeava na sombra, posso provar com as poucas fotos que restaram, parecíamos índios e ninguém sequer pensava em pegar uma cor. Nesta hora olhando para o campo a irradiação formava ondas. Ainda no verão tinha outro problema, o vento norte, significa chuva em três dias. A mãe dizia, ó começou o vento norte, vamos juntar lenha seca que vai chover. Era assustador, culminava com o terceiro dia de vento forte quente, no final do dia, o vento parava e “levantava”, mais uma vez do lado do Uruguay, pesada nuvem escura tomando todo o horizonte na “boca da noite”. Assim que diminuía a luz do sol já se podiam ver relâmpagos correndo de ponta a ponta e trovões “ao longe”, os empregados riam dizendo “trovoada de longe, chuva de perto “ em pouco tempo a tempestade nos atingia feroz. Não havia luz elétrica, um ano, olhando pela janela, durante os relâmpagos vimos que o vento tinha destruído totalmente a cobertura do galpão e secador.
Eu admiro muito o Planalto Catarinense, Lages, São Joaquim e outros lugares. Trabalhando por lá fui convidado para um “dia de campo” pela Epagri de São Joaquim, o assunto era poda de macieiras. Legal, me mandei para lá, aquecimento no carro e tal. Chegando no pomar em Bom Jardim da Serra vi um grupo de pessoas liderado pelo pesquisador em volta de uma macieira. Me encaminhei para lá, imediatamente reparei naquele vento gelado, continuado, vindo lá do lado do Pelotão, automaticamente me coloquei de costas para o danado. Não adiantou, primeiro as mãos foram gelando, depois, orelhas, nariz, como descrevi na lavração. Estava numa versão Serrana do conhecido Minuano, léguas longe mas era ele, eu sabia não tem alívio, disfarcei e fui para a volta do fogo no galpão. Aquele ódio recorrente ao ventos frios vivo de novo. Continuando o trabalho no Planalto, anotei outra questão, os fazendeiros faziam queimadas nas invernadas de modo alternado, ano sim ano não. A regra é, primeiro norte de agosto, fogo. Escrevi artigo no jornal dizendo “Queimaram os Campos de Lages”, foi mal, jovem voluntarioso, devia ter levado em conta a cultura do lugar, mais um episódio ligado a vento.
Durante um tempo me livrei do Minuano, morava em Balneário Camboriu, mas ali outras forças da natureza estão atuando. Agradável o inverno é, digamos, um tempo que não se vai à praia, então surpresa, por vezes “entra” um vento irritante. Joga areia para todo lado, enche a calçada e rua. Se você está de bermuda a areia é jogada nas pernas causando minúsculos ferimentos, daí resulta o famoso nome de “rapa canela” que os pescadores utilizam para se referir a ele.
Amigo se vc vai a praia com sua companheira, lembre, as garotas odeiam os ventos, como eu. O que passar de uma brisa, ativa um censor que as deixa muito sensíveis. O cabelo desarruma, os homens não entendem isto, mas é importante. Rajadas fortes, atiram longe, as cangas, desgraça, jogam areia na pele cheia de bronzeador, de repente tudo começa a dar errado. Se você perceber a pele, delas, arrepiada, desista do dia é melhor ir para casa.
Ainda no ultimo verão inventei de ir ao Santinho, não via o local desde janeiro de 1977, ano que comecei a trabalhar em Santa Catarina. Domingo bonito, faceiro, cheguei pensando que tudo ia bem. Esportivo desci para a praia carregado daquelas bobagens, cadeira, guarda-sol, e outras coisas. Poucas pessoas, alarmante sinal, um vento maral, me entende não é? Relevei, o dia é bom deve acalmar. Não acalmou, foi preciso segurar o guarda sol com vigor, droga. Mesmo assim ele deformou totalmente, olhei para o lado e o cara que aluga cadeiras estava recolhendo tudo. Perguntei e esse vento,” é o vento Sul ,vai durar três dias”, não tem jeito. Foi-se o domingo de praia.

Além mar, fui igualmente castigado, friagem dia inteiro, por vezes acompanhado de mini granizo que os joaquinenses chamam de quirera. Vinha de todo lado, eu nem sabia onde era o norte, o tempo ficava quase sempre nublado, um terror só. Eu ficava entrando em cafés, bares e lojas, bem quentinhas.


É a perseguição dos ventos, não me dou com eles.









IDIOMAS

Como relatei antes, atingi a graduação em Agronomia, pela inclusão social de antigamente, a lei do Boi. No Colégio Agrícola Visconde da Graça, em Pelotas, o técnico agrícola era mais voltado a disciplinas relacionadas com as técnicas agropecuárias, não tinha levado a sério o estudo de idiomas.
Depois de formado fui ajudar a levar um fusca zero que meu irmão, também agrônomo, ganhou do pai, de Dom Pedrito(RS) até Cianorte(PR). No primeiro dia fizemos escala em Porto Alegre. Então seguimos, revezando na direção, todo o dia e a noite, chegando em Maringá por volta de cinco da manhã. Esperamos abrir o escritório da firma e depois partimos para Cianorte, não demorou muito, antes do meio dia estava lá. Foi assim que conheci o Arenito Caiuá e uma plantação de café. Dormi um pouco numa pensão local, e saí para voltar de ônibus, saindo de Maringá perto da meia noite e chegando em Curitiba ao amanhecer. Imediatamente outro ônibus para Florianópolis, direto para a Acaresc fazer a inscrição no concurso. Em muitos anos era a primeira vez que as “EMATERs” do RS, PR e SC não ofereciam vagas livremente para quem quisesse trabalhar, fizeram testes de admissão. Fui aprovado, assim antes do Natal eu já tinha o meu primeiro emprego, era extensionista rural da ACARESC.
Meados de janeiro comparecemos ao famoso CETRE, Centro de Treinamento de Florianópolis, ali no Itacorubi. No calor do verão uma araponga cantava freneticamente na hora do descanso depois do almoço, se posso usar uma expressão forte, eu odiava ela, ficava num bar em frente. Quase dois meses de preparo, era o pré-serviço, aulas, reuniões, modo de trabalho tudo o mais. Amigo dos tempos da faculdade, o Silvio e o irmão mantinham barracas de acampamento no Santinho, várias vezes passamos o fim de semana naquele grande camping rústico, era um gramado. Gauchinho da fronteira lá eu aprendi o que era camarão e lula ao bafo, o prato preferido depois do futebol da praia.
Aquela expectativa, para que lugar do estado, cada um iria, eram mais de 45 entre técnicos, agrônomos e um veterinário. Todos sabiam que no final cada um podia, digamos assim, solicitar um local com vagas conforme a vocação. Eu tinha a impressão de que, não ficaria no litoral, iria para outro lugar. Esta difícil decisão ficou bem mais simples depois da excursão a campo que iria finalizar os trabalhos preparatórios. Tinha dois locais, lavoura de arroz, eu não quis ir, já conhecia bem, preferi o desconhecido. Vou explicar, o dia da visita era de um calor extremo, fazia o que se chama de Lestada, garoas intermediadas por olheiras de sol ou neblina. Nestas condições nos aventuramos numa demorada visita a uma super granja de suínos em Biguaçu. Pense bem, ciclo completo, milhares de animais, gritos, na terminação era utilizado um “suplemento” com ossos autoclavados, misturados com ração, aquele cheiro de gordura misturado aos outros aromas era de matar qualquer um. Foram horas percorrendo as diversas fases da criação, cheiro forte, forte de verdade.Cada vez que o grupo entrava num local os animais pensavam que iniciava a alimentação e gritavam loucamente, e saltavam nas baias nervosos. Aquilo tudo acarretou uma dor de cabeça, o cheiro de suíno “colou” na roupa, nos sapatos, no ônibus, não saiu mais. Decidi, fácil, fácil, não quero nada com este bicho, solicitei logo, quero ir para o planalto, campos, gado, lavouras, é comigo mesmo.
Que sorte, fui designado para Lages, em pleno coração do Planalto Catarinense, lindos campos e uma parte de plantações e reflorestamentos. Iniciar a vida profissional custou sacrifício, demorei um bocado para me ambientar, muitos colegas ajudaram. Passou certo tempo já conhecia bem o município, as lideranças, e ia competindo, ambicioso que era. O escritório era o maior do estado, eu num destes lances de sorte, como se diz, participei de uma eleição interna e me tornei chefe do escritório. Aí o destino armou uma cilada, trabalhávamos junto a uma estação experimental que tinha convênios com instituições estrangeiras e seguido vinham profissionais do exterior para fazer palestras e conhecer o lugar. Às vezes o meu chefe chamava e dizia, leve o Dr John para conhecer o município, visite alguns proprietários, claro, leve para almoçar e depois para o hotel. Aí alertava, não se preocupe muito com o inglês, só as coisas simples, vai explicando como é o trabalho, é isto. Na medida em que eu ouvia , ia ficando envergonhado, era obrigado a dizer, eu não sei nada de inglês e falar com um estrangeiro é praticamente impossível. Expressão de desapontamento é pouco para definir a “linguagem facial” do chefe, para me punir ele dizia “mas que coisa” então vou arrumar outra pessoa para fazer isto.
Havia ocasiões em que os estrangeiros faziam palestras para o público interno, grupos de 10 a 20 pessoas. Os pesquisadores da EMPASC, acostumados com demoradas leituras em inglês, já tinham estudado o assunto e até mesmo feito viagens ao exterior e participavam ao seu modo das entrevistas. Em certas passagens eles davam risadas e olhavam para mim, debochando eu pensava, da minha completa incompreensão. Depois condescendentes explicavam o que tinha sido dito, eu odiava sinceramente a situação. Nos congressos com tradução simultânea eu invejava os esnobes que deixavam de lado aqueles fones de ouvido. Jamais gostei de aparelhos “de ouvido” sejam fones, receptores de rádio e ficava irritado com aquilo, parecia uma perseguição.

Resolvi quebrar a constrangedora situação, reuni coragem e fiz matrícula num cursinho. Era duro, pedi para iniciar do zero, eu era o mais velho da sala, a moçada se divertia de montão. Para quem trabalha o dia inteiro, mais família e filhos é difícil sair à noite com umas apostilinhas, tarefas, follow the paterns, eheh. Passou um ano, forcei a barra com filmes e livros. Mudei de curso, mais um ano, o professor, era pastor religioso, foi embora. Outro curso, mais um ano. Nesta altura eu tinha melhorado um pouco, continuava com tarefas caseiras como filmes e livros, incluí gramáticas e dicionários. Neste terceiro curso o professor, o mais sábio nesta atividade que já encontrei, era muito bom e exigia participação durante as aulas, grande atividade, melhorei bastante, meu nível era o intermediário. Estava motivado, tinha passado a média das pessoas e seguia com o reforço extra de leituras, agora mapas, livros e filmes. O professor excelente fundou uma escolinha particular, sala de 14 pessoas, mudei para lá, continuei progredindo, a gramática melhorou. Neste ponto “os astros se alinharam” através de um acordo com uma escola estrangeira o professor organizou um grupo de interessados em estudar, “lá fora”. Imediatamente me inscrevi, funcionava assim, um mês, parando na casa de pessoas aposentadas que alugam temporariamente um quarto para estudantes.


A escola de inglês, na cidade de Colchester, UK, ficava a uma hora de trem de Londres. Nosso grupo era de 14 pessoas, nos dirigimos à escola e de lá em taxis até “nossas casas”, foi muito embaraçoso, corajosamente me apresentei, conversei, mal no início, mas deu para me arranjar. Era domingo, jantamos e vimos um pouco de TV e fui dormir, muito cansado.

No outro dia, outro sacrifício, acertar o ônibus de dois andares, típico, mas chegamos. Na escola fizemos um teste escrito e entrevista, não fui mal fiquei no Intermediate IV. Sala 12 a 15 alunos, por exemplo, duas alunas da Koreia, um da Líbia, uma da Ucrânia, um português, dois Italianos, duas da Turquia e um brasileiro, eu, legal não é mesmo.....Sabe como todos se comunicavam, em Inglês automaticamente. Isto foi tão forte que ainda hoje quando encontro um Hermano na praia meu reflexo é responder em inglês. A cada semana chegavam e saíam alunos dos mais diversos países. Durante o dia passavam pela sala, dois professores de manhã e dois pela tarde, todos nativos, os trabalhos iam até as 14 horas. Em vários dias tinha atividade como palestras gerais e pequenas encenações teatrais, churrascos também. Nos fins de semana, excursões pelas redondezas, Londres, Paris e outros lugares. Aventura que me fez superar a velha deficiência, acabei adorando a Inglaterra e seu modo de viver, não foi muito tempo, mas eu saia diariamente andando pela cidade observando cada detalhe.

Ciente disto quando os filhos tinham sete anos iniciaram os estudos de inglês nas escolinhas de Lages, as melhores certo, em alguns anos cumpriram todas as fases.

Decididamente não tem os problemas que marcaram tão forte a minha vida profissional.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

"Posperidade"



Hoje é muito comum ver caracteres japoneses em carros, camisetas, pastas escolares e tatuagens. De certa forma está na moda, assim como os pratos e sabores oriundos do Japão. Nesta linha vamos acompanhar a experiência que contamos em frente:

Feriado legal, a turma se mandou para Sampa, aproveitando ofertão casado, passagem na madrugada e hotel fino na baixa temporada.
O motorista do micro-ônibus,”sou o Ceará”, disse, simples, não conhecia a cidade, tava quebrando um galho, a firma não tinha outro. Alta noite parou, ali perto do Jockey e perguntou por um hotel num edifício grande. Gerou uma fúria expressa, foi mandado parar no pátio de um Supermercado e esperar o guia, aí sim do hotel, fomos comboiando. Chegando lá o Ceará ficou brigando com os equipamentos, o banho foi um caso, abria uma torneira e era água fria, tentava a outra e saia água muito quente, tomou banho frio dois dias ahahahah. Outra coisa, dividia o quarto com o guia da empresa de turismo, outro que não conhecia a cidade, tinha ido para ver como funcionava. No início tinha duas toalhas uma de rosto e outra de banho, como era, pequeno, se podemos nos expressar assim, pensou que a toalha de rosto lhe cabia por esta condição. Na seqüência dava risadas gostosas dizendo que um pessoal tinha esquecido bebidas numa geladeirinha, que sorte, pode isto? Bafão geral, motorista e guia sem prática, reuniu-se petit comitê, decisão: queremos outro guia, um que conheça a cidade. No outro dia chegou o prático, fora do padrão, parecia com um malandro, tinha uma ginga, falava gíria, cabelo alisado, gel e óculos escuros, sempre, dia e noite. Santo remédio, conhecia cada beco, arranjava estacionamento, ia passando pelos lugares, fazia sinais para os “donos da rua”, tipo assim, “vamo aliviá aí pessoal, eles tão comigo”.
Turma ligada na educação, o programa incluía, museus, pinacoteca, obras e mais obras, quadros, esculturas, literatura o dia todo. Eu de pirú, sempre de olho em botecos com aquela encantadora torneira dourada onde se enchem canecos de chopp e coisas assim. No terceiro dia fomos premiados: numa famosa esquina da Av São João havia um point com as tais torneiras, fui obrigado a chegar, tirar foto, e, beber uns copos gigantes de um refrescante chopp.

Nas “vagas” da agenda cultural, uma passada no centro velho, minhocão, Igreja da Luz e compras na 25 de março. Sem gosto por estas aglomerações, atendimento sem qualidade, nem pensei em negociar coisa alguma. Quando descobrimos que o mercado público era ali perto zarpamos direto. Gastamos um tempo nas bancas cheias de temperos do mundo inteiro, e mais aquelas bobagens todas, pastel de bacalhau, sanduíche de mortadela e depois aquela fatia de abacaxi cortado na hora, doce, muito doce.

No domingo de manhã alguém sugeriu: gente tem a feirinha da Liberdade. Foi o que bastou, nosso guia foi direto, era um programa dos mais simples, ele tava com os nervos em cacos, na noite anterior, de improviso, ele teve de achar uma pizzaria no Bexiga, todos palpitavam, essa não é boa, parece muito cara, sei lá o lugar, cabem todos, tem estacionamento. É que tínhamos ido ao teatro, lindo lugar, artista global, quando acabou, ninguém quis ir dormir, daí resultou o desgaste do guia para arranjar um lugar para jantar. Deu certo a idéia da feira, não tinha sido minha, havia um acordo tácito, só as mulheres mandavam, havia dois maridos, um professor e o guia iniciante, não tivemos condições de competir. Primeiro zanzamos pelo bairro, simpático lugar com o calçadão de luzes que sempre aparecem nos postais. Na feirinha todos se dispersaram, interesses diversos, comprando quinquilharias em geral, canecas, camisetas, chaveiros, ímãs de geladeira(verdadeira salvação de pobres excursionistas), de resto é o que fica de tantas aventuras.
Era numa pracinha, logo, os grupos começaram a cruzar, você ouvia “olha o que achei”, entre eles correu notícia “tem um monge budista que escreve o seu nome e uma oração, naqueles caracteres nipônicos”. Ele usava quimono preto, e aquele banda em volta da cabeça com alguma coisa escrita. Na verdade ele vendia um marcador de livro, podia ser vermelho ou preto. Em sua frente ele escrevia uma oração no marcador, perguntava o seu nome e rabiscava mais uns caracteres. Depois ele olhava para o freguês e dizia o que significava. Na fila eu fiquei cuidando como funcionava o sistema. Se a pessoa era idosa ele dizia, exe aqui hamonia, se jovem, exe aqui posperidade, meia idade, exe aqui paiz e assim levava dez reais cada marcador. Tenho o meu até hoje, é “posperidade”, exigi, ele queria me dar um de paiz, na minha ignorância em caracteres, parecia que ele desenhava as mesmas coisas e dizia o que cada um queria ouvir seguido de uma reverência. Sabe o que acontecia, todos saíam, felizes da vida, abanando o marcador de livro esperando secar a tinta.

Falei que a excursão era “em conta”, embarque em Guarulhos, seis horas da manhã. Calcule hotel no Morumbi, uma hora de ônibus, mais uma hora antes da saída, resultou em acordar três da matina, camarada o hotel serviu um café expresso numa salinha à parte. Mas valeu pela aventura, muito boa, na volta as pessoas diziam: vamos de novo, agora para outro lugar. Fiquei quieto, sei que isto não funciona, quando foram organizar um outro roteiro, nada mais combinava, claro é assim mesmo.

Viram o marcador de livro acima, é para estar escrito o meu nome e “Posperidade”, se alguém quiser colaborar e indicar que tipo de oração está registrado será bom.



sexta-feira, 25 de abril de 2008

Lanche natureba



Velha instituição se renova, é a feira livre na rua. Lá por volta de 1970 eu morava numa república em Pelotas com os irmãos. Cansados do arroz com alguma coisa, charque, guisado, salsicha, picadinho, começamos a ir numa feira que tinha na frente do apartamento. Assim passamos a incluir saladas e frutas na dieta. Nos últimos anos ficaram mais populares os sacolões, e alguns tipos de feiras permanentes. Estes tem um problema são um tipo de self service sem interação com o vendedor ou feirante.
Aqui visito regularmente no sábado, a feira do Juvevê. Local de confraria, conversas amistosas e um ir e vir democrático. É uma entidade, serve, em nosso caso, para conhecermos, de fato as pessoas que moram pelas redondezas. Ela atrai tipicamente os moradores do entorno, muitos se conhecem, falam sobre futebol e outras coisas. Os feirantes, por seu lado, verdadeiros mestres no relacionamento humano, brincam e ensinam coisas, como preparo de alimentos, se as frutas estão maduras, na maior alegria. Iniciamos entendimentos, compramos uma sacola, “I’m not a plastic bag” na cidade existe um propósito de substituir as sacolas plásticas de supermercados, eles tem sofrido multas severas.

Demorei na banca dos chás, tinha poejo, lembro de quando eu era um garoto, talvez, sete anos, um cavalo nosso escapou para o campo eu e meu pai fomos tentar trazer de volta. Na caminhada ele apanhou um punhado de poejo e pediu para eu guardar, era um ótimo chá para gripe - veja que cheiro bom - nunca esqueci. Trouxemos uns pacotinhos de verduras já cortadas, a preguiça dos tempos modernos impressiona. Queria comprar pinhão, mas lembrei que não tinha panela de pressão, parece uma coisa, ficou na república dos filhos. Poderia fazer um carreteiro, vi um charque de qualidade, mas a minha panela de ferro ficou numa destas mudanças de endereço, foi-se a velha companheira dos domingos. Eu me defendia no carreteiro, ficava horas preparando e conversando com quem estivesse em casa, é um tipo de socialização. Sempre tive influência da mãe ela tinha uma panelinha de ferro para fritar ovos e bolinho, jamais grudava.

Dia destes ataquei um pastel, sempre ouvi comentários sobre pastel de feira, resistia, depois que inventaram o colesterol, ficamos com poucas opções. Garanto, estava delicioso. O point do pastel é o mais concorrido, junta povo. Vendo esta situação fico com a impressão de que só eu me importo com esta história das gorduras. Nem me animo a olhar o salame “meia cura” levemente defumado. Antes se colocava direto, em cima das brasas, do fogão à lenha, acompanhava o café da manhã com polenta brustolada. Um novo tempo, todos de impecável uniforme branco, aquele boné regulamentar, tudo muito lindo. É assim com todos que lidam com alimentos para consumo imediato e do grupo das carnes.

Ontem, achei uma variante natureba para o lanche da feira. É a pamonha, feita na hora, muito saborosa. Eu aprendi a gostar deste produto, depois de uma pamonhada, no tempo do Projeto Rondon em Goiás, muitos sabores. Eu pedi uma salgada, é totalmente natural, só milho verde ralado cozido na água fervente. Sem qualquer indício de excesso de gordura, sal ou outras coisas. De longe tem um sabor de polenta. Mais uma vez comemos em pé na rua. Acontece que já começou, de leve, a campanha eleitoral. Desta forma, podemos ver que um aglomerado espontâneo como este, é como um comício de graça, não precisa promoção. Um político, cotado, não vai sozinho, primeiro vão dois carros com segurança e uns assessores. Eles se distribuem por ali, e tomam conta de umas mesas. Em seguida celulares disparam mensagens, pronto aparece o homem, que assim vai “encontrando” amigos como se fosse a pessoa mais popular do mundo. Tudo leva ao principal ponto, chegando perto do local mais concorrido, bancas do pastel e da pamonha, naquelas duas mesas estratégicas reservadas, dúzias de correligionários já se acumulam e fazem a maior festa como se fosse uma surpresa a presença do famoso. Imediatamente, alguém sugere um pastelzinho, claro ele aceita. Desta maneira, já por duas semanas eu, sem “equipe precursora” faço uma boquinha em pé mesmo.

Aqui vamos fazer um reconhecimento a esta planta natural da América do Sul, o milho, havia sido domesticada pelos índios. Morando em Balneário Camboriú uma das coisas mais gostosas da praia era o milho verde, muito bem preparado nas dezenas de bancas da praia. Diga-se feito em casa não fica tão bom, tentei várias vezes não deu bem certo. Mais uma vez, aperitivo rico, muito rico, fibras, amido, betacaroteno um pouco de proteínas. O milho verde se instituíu, como opção nas praias de todo o Brasil, sem qualquer tipo de propaganda. Quando os filhos eram pequenos, eu levava para a praia uma faquinha de mesa e cortava os grãos na fileira da espiga, era uma solução simples, porque eles não mastigavam direito e ficavam com dor de barriga. Todos adoravam o milho e seria impossível dizer hoje não ou coisa assim.
Abraços

sexta-feira, 18 de abril de 2008

"Sim minha Generala"



Muitos especialistas têm se dedicado a estudos do comportamento humano, mas ainda não vimos obras relatando as situações que temos encontrado. Mostramos então alguns exemplos.

‘O que está fazendo aí parado, porque não pega o pão de uma vez, precisa ficar olhando tanto”, idoso pega o pacote da frente e segue em silêncio a mulher que continua repreendendo-o pelo corredor do Hipermercado.


Eles escolhem mesa e sentam, a mulher chega depois com uma sacola, avalia a situação e decide mudar de mesa. Constrangidos a seguem sem reclamar na choperia do mercado público.


Pai e filho chegam na praia carregados de cadeiras, guarda sol, esteira, montam tudo no sol de janeiro. No tempo certo de tudo estar resolvido, aparecem mãe e filha, combinando, tamanco, biquíni, chapéu, fita na bolsa de praia, tudo amarelo. Ela “dá uma benzida” de protetor no filho e despacha. Depois passa longo tempo arrumando a filha, escova no cabelo, cuidadoso creme na mocinha, ajusta meticulosamente as alças do biquíni, bonezinho estiloso. Por fim chega o momento de cuidar de si mesma, novamente um demorado processo, cuidado extremo, tem um bronzeador para início do sol, spray umidificante, toalha imensa, esteira, cadeira reclinável e água sem gás. Pronto ela se instala, pega um livro e se concentra. Durante este tempo, aflito, o companheiro ficou ali pronto a atender qualquer necessidade. Aliviado, ele senta, olha para o lado, tem cerveja no quiosque, quem sabe, logo a mulher se vira e diz, “tá vendo eles”, resignado ele tem de levantar e ir pro sol cavar buracos na areia com as crianças. Ahahaha.


“João vem prá cá, que coisa, presta atenção”, situação na portaria do hotel, diante de todos mulher chama atenção do marido na excursão da terceira idade, brinca com as outras, se deixar ele é capaz de se perder, hehehe.


No shopping, os homens seguem as mulheres que vão passando de loja em loja incansáveis, sentam desolados naqueles bancos do centro do corredor, elas riem gostosamente, acenam de dentro da loja, enquanto a caixa, retira aquelas fitinhas de contas no cartão.


Amante da política, assisto a campanha eleitoral pela TV. Ninguem tem a coragem de manifestar qualquer tipo de apoio aos pobres seres humanos masculinos. Agora, defensores das mulheres, tem a varrer, dispostos, olhos brilhando de emoção, tem projetos de todo tipo para gestantes, delegacia da mulher, direitos e mais direitos.


No BBB, as queridinhas não se dignavam a fritar um ovo, foi tudo delegado para os marmanjos.


Um capítulo especial, redundante expressão, é para as novelas, ali aos homens foi destinado, em geral, o papel de malvados, alcoólatras, tolos e, digamos assim, passados para trás. Elas, altruístas e corajosas, empreendedoras até não poder mais.


Em colégios, as garotas dão a maior força para o uso de símbolos femininos, assim os meninos andam carregados de brincos, colares, anéis, pulseiras, essas coisas, acreditam nelas que coisa não.


De tanto levar bronca, os homens desistiram de pedir pratos ou sabores, no caso de pizza, é melhor não se incomodar, pensam, deixe que as mulheres se virem. Afinal, tem de ser como “elas querem”. O garçom, treinado, traz o menu para o cavalheiro, e elas já vão tomando “deixa eu ver o que tem”. Quando ele vem anotar o pedido e olha, novamente para o homem, seria, assim na escola deles, tem de se virar e escutar a companheira atalhar e decidir, raso, “salmão à belle moliere” para mim, “vê o que vc quer”, ahahahahah. A experiência mostra que se “outra pessoa” pedir um prato e não for muito bom, a gente deixa para lá, mas se foi você, não escapará de ouvir “claro tinha logo que pedir o mais barato” aahahahahaha. Quase esqueci da escolha da mesa, delicada situação, sensível mesmo, defensivamente faço de conta que estou colocando a chave do carro no bolso e espero que saia um “aqui tá bom” depois da sugestão do maitre, aí remato, sim, sequer cogito pedir outro lugar, já pensou se não dá certo.


Escolher o vinho, ainda é tarefa deles, coisa mais complicada, sabe-se lá tantos tipos, precisa curso, não esperamos tanto, as mulheres nem dão bola para isto, não conta.


Sobre isto, meses morando sozinho, percorrendo os restaurantes do centro, fazia análise dos pratos expostos, até comentava, para mim mesmo, a solidão tem destas coisas. Outro dia levei maior carão, “pare de falar com a comida, não sei de onde pegou esta mania”, é que tinha dito, “a dobradinha tá legal... hum feijão nadando na graxa..... agora um purezinho...sei lá este tipo de macarrão parece uns corozinhos que apareciam quando lavrava o campo”. É assim a vida. Os vizinhos de fila olharam para o lado e seguiram em frente quietos, eu também.


Acabei de ouvir um “arrume uma jantinha para nós”, vale dizer, coloque para esquentar o jantar, pratos na mesa, óleo de oliva e abra o vinho. “Sim minha generala” respondi, expressão que aprendi num filme desses, tinha uma revolucionária que dava ordens sumárias para seu amante, leve meu cavalo, e ele “sim minha generala”, tomou banho então venha dormir, “sim minha generala”.


Situações constrangedoras têm sido vistas diariamente, chama a atenção o comportamento despótico das companheiras. Intriga a passividade masculina, aparenta que cansados de briga os outrora valentes competidores desistiram. Em princípio sutis maldades minam a resistência dos mais bem intencionados. Depois, sem pena, fulminam as mais simples iniciativas, como a idéia de um happy hour num boteco qualquer, é preciso, para tudo, um referendo. Chega ao ponto que não se decide nada mais, no escritório corre lista de adesão para o churrasco de final de ano, a pobre estagiária vai ouvindo coisas como sei lá, vou ver em casa, precisa responder agora, depois eu vejo, amanhã dou resposta. Entendeu, precisa do referendo.
Seria por isto, quem sabe, que eles vivem menos. Talvez a longevidade menor se deva a trabalhos forçados, perigosos, cansativos ou uma vida de tensões. No início da vida em comum os homens, inexperientes, cometem imprudências como dar opinião sobre o corte dos cabelos, é muito arriscado. Hoje sabemos, quando a mulher chega do salão, a única expressão permitida é “nossa ficou lindo”. Iludem-se na procura de um padrão, mas o que é alegre e festivo num dia, na próxima semana resulta desastroso, confundem-se com os sinais recebidos.


Pensando em tensões é possível que tenham adquirido alguma síndrome que se relacione com a tentativa de compreender a alma feminina. Passadas algumas décadas de genuíno esforço adquirem um comportamento errático, não reagem mais.
A imagem acima registra o momento em que recebo a informação de que está faltando cerveja na mesa, resposta "sim minha generala".


abraços



Selso Vicente Dalmaso